5.7.09

Continuação

INT. DIA HOSPITAL

Alan ouve POLLIN falando a ANNE.

POLLIN - Por favor, não interpretes mal, Anne, mas quero saber se ele tenciona voltar ao trabalho. Já há semanas que estou sem o meu Cirugião-chefe.

ANNE - Desculpe. Já não vejo o Nick... o Dr. Cavanaugh, desde a sua festa.

POLLIN - Estou a ver... Bom, se ele não voltar, tenho que assumir que o perdi para outro hospital. Seria uma perda tremenda, mas talvez ele pudesse deixar uma carta a recomendar um cirurgião substituto. Se souberes alguma coisa dele, por favor telefona-me.

ANNE - Muito bem Dr. Pollin.


INT. DIA - CASA DO NICK

Alan observa do lado de fora, após tocar a campainha. A porta principal é de vidro. NICK abre a porta sorrindo.

NICK - Alan, (olhando pro céu) que dia lindo! Que bom ver você. Quer café gelado?

Alan (entrando) - Ah, sim.

NICK serve a bebida. Pausa. Alan observa o telefone, desligado e enrolado no fio.

NICK - Então... Em que posso ajudá-lo, além de matar a sua sede?

Alan - Bom, é... Eu achei que poderia me recomendar para o seu cargo no hospital... Está indo embora.

NICK - Alan Harrison, cirurgião-chefe.

Alan - Eu achei que poderia escrever uma carta ao hospital. Eu estou mais que qualificado.

NICK - Mas eu tenho até segunda para voltar, não é mesmo. 

Alan - É, eu sei.

NICK - Então vamos saber na segunda.

Alan - É... (pausa constrangida) Então, você tem gostado desse tempo sozinho?

Ouvem-se batidas vindas de um dos quartos. Alan estranha... NICK ignora o barulho.

NICK - É muito agradável, é.

Alan - Eu me lembro da minha primeira... (sua fala é interrompida por outra batida, ainda mais forte) O que é isso?

NICK (correndo) - Fique aqui, Alan.


INT. DIA - DORMITÓRIO

NICK no quarto com HELENA na cama, sem as pernas. Ela parece entorpecida, e está caída como que desmaiada. Ouve-se a VOZ do repórter num telejornal. NICK a recosta no travesseiro, enquanto diz:

NICK - Helena, você não queria ouvir música?

Nesse momento, Alan surge na porta do quarto, perplexo.


INT. DIA - OUTRA SALA

NICK sai do quarto de HELENA e fecha a porta.

Alan - Que que está acontecendo aqui?

NICK - Ela foi atropelada por um carro lá fora. O motorista fugiu e quando eu cheguei, ela estava com hidropisia e cianose. Ela corria risco por causa da pressão, eu tive que operá-la no laboratório.

Alan - Nick, isso não tem precedentes. Por que ela não está no hospital?

NICK - Eu já cuidei de tudo e estou cuidando dela. Eu ia contar para você...

Alan - Escuta aqui, Nick. Eu vou ligar pro hospital e levá-la para lá. Eu sei que você quis o melhor cuidando dela...

NICK - Venha aqui. (vão para a outra sala)

Alan - Alguém precisa vê-la.

NICK - Escute uma coisa, Alan, eu quero tomar conta dela e eu posso fazer isso. Uma mulher como a Helena não vai sobreviver num hospital, com todas as constantes lembranças de sua perda. Ela está feliz aqui, ela não quer ficar com outros pacientes. Eu quero o bem dela.

Alan - Não é assim tão simples, ela precisa de cuidados vinte e quatro horas. E a sua vida?

NICK - Eu a amo, ela está feliz aqui. Eu ia informar o hospital da minha demissão para que eu pudesse estar aqui, para ela. Pegue o emprego.

Alan - Eu já disse, não é tão simples.

NICK - Eu vou ligar para o hospital na segunda e dizer que não vou mais voltar.

Alan - Eu não sei... Você vai escrever a carta?

NICK - O emprego vai ser seu, eu prometo. Ela vai estar segura aqui. E você é a escolha ideal para me substituir. Eu vou mandar a carta imediatamente.

NICK vai guiando Alan cuidadosamente para fora.

Alan (atordoado) Adeus. (volta um segundo depois) Se perguntarem... eu não estive aqui.

NICK - Adeus, Alan.

Fecha-se a porta. NICK suspira de alívio; Alan recoloca os pensamentos em ordem, do lado de fora da porta. 

INT. DIA - DORMITÓRIO

HELENA saiu do estado de choque e adentrou a fase do desespero, está procurado as pernas.

HELENA - Minhas pernas, cadê elas? Elas estão aqui...

NICK - Helena, você sofreu um acidente.

HELENA (desesperada) - Tá tudo bem, tudo bem...

NICK - Olha para mim, Helena, está tudo bem.

HELENA - Minhas pernas, estão queimando, estão queimando (entre lágrimas) Minhas pernas...

Dissolve para cena da estátua sem pernas e com braços.


DIA SOL EXTERNA

NICK plantando flores.


INT. DIA QUARTO DE HELENA

Ela está na cama. NICK adentra trazendo consigo uma cadeira de rodas.

NICK - Bom dia!

HELENA lança um olhar raivoso para ambos e ordena, ríspida.

HELENA - Quero que você leve isso para longe daqui.

NICK - Mas é para você poder... para você poder passear. Eu ajudo você a sentar-se nela.

HELENA - Sua ajuda... Sua ajuda é o que me pôs aqui, para começar.

NICK - Não.

HELENA - Sim! Eu não estaria aqui se você não tivesse se atrasado para chegar na droga do aeroporto! Se você não fosse tão incompetenteeee! (joga um objeto nele, mas erra) E tão estupidamente idiota!

NICK (saindo) - Helena, pelo menos você está viva.

Ela continua a jogar coisas no chão. NICK sai, fecha a porta e fica do lado de fora, ouvindo os gritos dela. Essas cenas dele se intercalam com as de um pombo se debatendo dentro de uma gaiola. 
Dissolve.


EXT. JARDIM DIA

NICK colhendo rosas vermelhas.


INT. DORMITÓRIO

HELENA dormindo. Ela acorda e a primeira coisa que vê é um bilhete de NICK, perto de uma rosa que ele colheu: “Quando você estiver pronta. Te amo, NICK”. Ela volta a dormir. 


ENTRADA CASA NICK - DIA EXT.

LAWRENCE chegando de carro. Bate à porta e chama, mas ninguém responde. Enquanto espera, pega vários jornais que estão no chão e também mais um que o entregador acaba de jogar.

LAWRENCE - Nick?

NICK está do lado de dentro, observando-o e esperando que LAWRENCE vá embora. Após chamar três vezes, LAWRENCE vai embora. NICK o observa entrar em seu carro e ir. Nesse momento, HELENA surge em sua cadeira. 


INT. DIA HOSPITAL

ANNE ao telefone, sentada, esperando que NICK atenda. Após vários toques, ela desliga, desconsolada.


INT. DIA - SALA DE ESTAR CASA NICK

NICK sentado sobre o tapete, olhando fotos de HELENA... Ela entra.

HELENA - Você é patético.

NICK - Eu só quero cuidar de você. Você é tudo para mim.

HELENA - Você não é nada para mim. Não deixarei que se importe comigo. Ninguém nunca se importou e nunca vai se importar. (Sai da sala e ele corre atrás dela...) Por favor, me deixe em paz!

NICK - Olha, deixe-me explicar. Olha, foi só por que...?

HELENA - EU DISSE, ME DEIXA EM PAZ!

NICK - ENTÃO VOCÊ QUER GRITAR, NÃO É? DEIXA EU OUVIR O SEU GRITO.

NICK a leva para a varanda. Linda paisagem, chuva forte.

NICK - VOCÊ QUER GRITAR, HELENA? VAI EM FRENTE, GRITA! VAI, GRITA POR AJUDA.

HELENA - Larga essa cadeira.

NICK - NÃO, VAI EM FRENTE, GRITA! GRITA PARA ESSAS PESSOAS NA JANELA PODEREM TE OUVIR. DEIXA EU TE OUVIR, EU NÃO ESTOU TE OUVINDOOOOO!

HELENA (mais calma) - Vem aqui, Nick.

NICK - ANDA, GRITA!

HELENA - Por favor (esticando um dos braços para ele) Por favor, vem aqui. Por favor. (ele chega perto dela, ela o acaricia) Tudo bem. (e, de repente, dá um tapa no rosto dele.) SOCOOOOORROOOOOOOOO! SOCORROOOO!

Ele a leva para dentro e ela continua a gritar. 


INT. DIA COZINHA NICK

Chaleira sendo posta no fogo.


DORMITÓRIO

HELENA sentada em sua cadeira de rodas. NICK entra e lhe traz uma toalha.

HELENA - Sabe de uma coisa. Eu nunca tive um orgasmo com você. Nenhum. (rindo) Você tremia o tempo todo. Lembra que eu tive que te dizer o que fazer? Mãos para tudo que é lado! Escorregando. Tremendo, tremendo, tremendo.

NICK (distanciando-se dela) - Eu estava com medo.

HELENA - Deveria continuar com medo.

NICK - Eu só queria fazer você se sentir bem.

HELENA - Você não faz idéia de como me fazer sentir bem. Agora eu te conheço. O que você pensa, o que te apavora. Conheço teus segredos. Consigo ouvir você chorar e tremer. Consigo ouvir você se masturbar.

NICK - Você está louca.

HELENA (rindo) - É, estou louca.

NICK - Eu não quero falar nessas coisas.

HELENA - Não?

NICK - Não desse jeito.

HELENA - Talvez seja por isso que você transa desse jeito.

NICK - Você é horrível!

HELENA - Você é um fracasso!

Sai do quarto, deixando-o muito triste. Cena da chaleira apitando.


INT. NOITE - LOJA DE CONVENIÊNCIA

RAY entra.

SAM - Boa noite, sr. Omali.

RAY - Escuta, Sam, preciso de um favor. Eu tô procurando a Helena. Se você a vir, se ela ligar, se qualquer pessoa ligar, me avisa. É importante. (tira um cartão de visita e entrega a Sam) esse é meu cartão (entrega o dinheiro) e um incentivo.

SAM - Às ordens.

RAY pega uma maçã, morde e sai comendo-a. Sam fica olhando para o cartão.


INT. NOITE. CASA DO NICK

ANNE está do lado de fora da porta, retocando a maquiagem. Toca a campainha.
HELENA insiste em aparecer e começa a gritar. Seus gritos foram abafados pela ópera que NICK ligou, bem alta.
NICK tenta escondê-la, a amordaça... ela, por sua vez, faz tudo o que pode para se desvencilhar dele... Não consegue. Ele a leva para outro cômodo e a tranca lá.

ANNE (procurando a chave da bolsa) Nick, eu já estou entrando. Tudo bem?

NICK tenta colocar tudo no lugar, apressadamente. Enquanto isso, HELENA se solta e corre com sua cadeira em direção ao hall principal. Ela pára bem na frente da porta, mas ANNE não a vê, porque abaixou-se para pegar algo que caiu no chão.
NICK corre e consegue levar HELENA de volta, que continua gritando. Toca uma nota mais baixa.

NICK - Helena, por favor...

ANNE destranca a porta e adentra o hall.

NICK (surgindo de repente) - Anne! Desculpa, eu estava trabalhando. Está tudo bem?

ANNE - Eu estava preocupada com você... e com a gente. Senti sua falta. Eu tentei ligar, mas não consegui falar com você.

NICK (abraçando-a) Está tudo bem.

ANNE - Não sabia o que pensar. O que que você anda fazendo? O dr. Pollin perguntou por você e eu não sabia o que responder.

NICK - Anne... 

(tira a bolsa dela e a abraça novamente. Estão bem no ângulo de visão de HELENA)

ANNE - Nick...

NICK e ANNE COMEÇAM A SE BEIJAR. ANNE começa a tirar a calça dele.

ANNE - Relaxa, Nick...

NICK - Anne... (apreensivo)

ANNE - Relaxa, Nick...

Continuam. NICK tira a blusa de ANNE e vê o rosto de HELENA, dizendo: “Vamos transar, Nick” e fica perturbado.

ANNE - Tudo bem, amor. Tudo bem, acontece. Não tem importância, Nick. A gente se apressou. A gente tenta daqui a pouco, Nick, tá tudo bem, tudo bem. Eu vou buscar um bebida para nós.

ANNE sai de cena, enquanto NICK se veste.


INT. NOITE - OUTRA SALA - CASA DE NICK

ANNE está servindo uma bebida para ambos. NICK entra e senta-se num sofá. Ele senta-se a seu lado.

ANNE - Vamos só sentar e conversar um pouco.

NICK - Eu não quero conversar.

ANNE - Tá, não precisa conversar, só fica comigo.

NICK - Eu quero ficar sozinho.

O telefone toca. NICK se levanta, zangado.

NICK - Foi você que fez isso?

ANNE - É, achei que tinha soltado.

NICK (tirando o fio da tomada) - Não imaginou que eu poderia ter um motivo para isso, que talvez não quisesse ser incomodado?

ANNE - Desculpa, não sabia disso.

NICK - Anne, é melhor você ir embora. Agora.

NICK a acompanha até a porta, entrega-lhe a bolsa e as chaves. Ela pega e, tirando a chave da casa dele entregando-lhe, diz:

ANNE - Se é isso o que você quer, Nick, toma sua chave.

NICK - Eu sinto muito.

ANNE - É, também sinto. 

ANNE sai. Close no rosto de HELENA, amordaçada e feliz. NICK fica próximo à porta, observando ANNE entrar em seu carro e ir. Quando ela sai, NICK avista um vulto por detrás da vegetação. Música de suspense. Desconfiado, ele entra, tranca a porta. Joga a camisa na lixeira e coloca outra. Senta-se e disca um número.

ATENDENTE - Flores Max, boa noite.

NICK - Oi, aqui é Nick Cavanaugh.

ATENDENTE - Olá, dr. Cavanaugh. O que o senhor deseja hoje?

NICK - Ah, uma coisa extravagante pro endereço de sempre. E no cartão, escrito "Helena, estou com saudades".


INT. DIA - QUARTO DE HELENA

HELENA - Você passou a vida toda sentindo vergonha. É patético. Quanto tempo você demorou? Três segundos? Ah, e parece que (imitando a VOZ de ANNE) “Tudo bem, meu amor, porque acontece”. De novo, de novo e de novo. Eu não sei como é que ela agüenta isso. Da última vez comigo demorou o que? Trinta segundos? Você não passa de uma piada.

NICK (correndo até ela) - Você não entende? Eu amo você. Se fosse uma mulher de verdade, mentiria sobre nossa vida sexual. Mulheres de verdade sempre mentem; homens de verdade também.

HELENA (ríspida) - Gente de verdade faz um monte de coisas e pode apostar que mentem. Mas quando mentem sobre sexo, é por amor, dignidade, respeito por certos sentimentos. E eu não dou a mínima para os seus sentimentos!

HELENA começa a esgoelá-lo. Cenas do rosto dela se intercalam com as do rosto da LOIRA da primeira cena.
NICK se desvencilha dela. Ela grita.

HELENA - Para que mentir?


INT. DIA DE SOL, CASA DE HELENA

Flores na escada. RAY entra, vê o lindo buquê e lê o cartão. “Saudade, Helena. Onde você está? Me liga, por favor. Te amo, Nick.” Amassa o cartão.


INT. NOITE - CASA DO NICK SALA DE TV

Travelling. NICK está sentado no sofá da sala de tv, ouvindo música, bebendo vinho e vendo o vídeo da festa. Helena aparece na tela, a parte em que ela entra na fonte.
Externa da casa, com a fonte e tudo, no mesmo quadro. NICK surge pela porta aberta, sentindo a música, no talo.
Intercalada com cena de HELENA dormindo.
Novamente, NICK de frente para a fonte, na escada. Ele entra e fecha a porta. Música termina.
Focaliza na estatueta sem braços e sem pernas. Ouvem-se passos, mas não são passos, são pulos. NICK está pulando corda. De repente, ele pára e vai para outro cômodo.

NICK (V.O.) - Me desculpa, eu esqueci o seu remédio. Eu já volto.


INT. DIA QUARTO DE NICK

NICK em seu quarto, pegando um remédio numa das gavetas do criado-mudo. Ele olha para trás e vê a LOIRA que surgiu no início do filme.

LOIRA - Nick, você fez uma coisa má, muito má.

NICK desce as escadas correndo, com um copo com canudo. Vê-se HELENA, num pedestal, sem os braços.

NICK - HELENA, isso vai fazer você melhorar. Me desculpe, eu sei que é difícil, mas você está linda hoje e as flores estão frescas.

Dá o remédio a ela. De repente, ela desata a rir, num misto de desespero e de desprezo por ele. Ele vai para outra sala, se esconder. Após quase um minuto, ela pára.

HELENA - Não tem importância, não muda nada.