12.4.10

Parte 2

Wilson surge trazendo um balde de gelo com champanha.

BRANDON - Toda enfeitada!

WILSON (vaidosa, arrumando o cabelo) Você acha?

Wilson sai de cena, sorrindo. Servem champanhe a Kenneth.

PHILIP - O que foi?

KENNETH - Sinto-me honrado.

BRANDON - E por quê?

KENNETH - Parece uma pequena festa de despedida.

BRANDON - Matamos dois coelhos com uma cajadada só. É para o Sr. Kentley.

KENNETH - (triste) O pai de David?

BRANDON - Sim.

KENNETH - David virá?

BRANDON - Mas é claro?

KENNETH - Quem mais vem?

BRANDON - Ninguém que não conheça. Os Kentley, a Janet Walker.

KENNETH - A Janet.

BRANDON - Sim. Achei que ficaria feliz em vê-la. Não ficará?

KENNETH - A Janet e eu terminamos, Brandon. Não sabia?

BRANDON - Sinto muito, não sabia.

KENNETH - Você sabia, Philip?

PHILIP - Ouvi dizer, mas não presto atenção a estas coisas.

KENNETH - Deveria prestar.

PHILIP - Por quê?

KENNETH - A Janet e o David estão...

Campainha toca. Wilson atende.

JANET - Olá, Sra. Wilson.

KENETH - (Olha sua taça vazia) Posso?

BRANDON - Sirva-se. Anime-se, tenho a impressão de que agora terá chance com ela.

KENNETH - O que quer dizer?

Brandon e Kenneth vão receber Janet à porta.

BRANDON - Janet!

JANET - Ei, pessoal. (abraça Brandon) Anjo. Cuidado com meu cabelo. Como está cheiroso. O que é?

BRANDON - O perfume que me deu no Natal passado.

JANET - Sabia que tenho bom gosto.

BRANDON - E tem. Está bonita.

JANET - Quando acabar de pagar já não estarei. (Brandon ri) É engraçado? Nunca sei quando sou engraçada. Quando tento ser dou a maior mancada. Philip querido. (abraça-o) E esse boato de você na Prefeitura? Vai nos pregar uma peça mórbida e ficar... (ao ver Kenneth) horrivelmente famoso.

BRANDON - Já se conhecem.

JANET - Olá, Ken.

KENNETH - (sorrindo) Olá, Jan.

JANET - Foi fascinante, não foi? Parece que fiquei sem corda.

BRANDON - Que me diz de um champanha?

JANET - "Olá, Champanha"? Entendeu o que digo sobre tentar ser engraçada?

Brandon serve champanha a Janet.

JANET - Como anda, Ken?

KENNETH - Bem, obrigado. E o emprego novo?

PHILIP - O que está fazendo?

JANET - Escrevendo a mesma coluna sobre como manter o corpo bonito.

PHILIP - Para quem agora?

JANET - Uma revista chamada "Allure". (pega a taça e bebe) Obrigada, amigo. Esse quadro não é novo?

BRANDON - É, você gostou?

JANET - Sim. O que é?

BRANDON - Jovem primitivo americano.

JANET - Tenho uma jovem irmã americana. Tem três anos e faz coisas primitivas.

Todos riem. Ela fala baixo a Brandon.

JANET - Seu safado. (a todos) Não tem outro novo ali na entrada?

BRANDON - Acho que não. Qual?

Ela aponta para uma parede vazia, do outro lado.

JANET - Este. (falando baixo) Podia te estrangular.

BRANDON - O que fiz agora?

JANET - Seu senso de humor chega a ser malévolo.

BRANDON - Do que está falando?

JANET - Por que convidou o Kenneth?

BRANDON - Por que não?

JANET - Sabe muito bem por que não. Desmanchamos há tempos. Estou quase noiva do melhor amigo dele.

BRANDON - O David?

JANET - Sim, o David. As coisas ficaram perfeitas agora.

BRANDON - Sinto muito, mas é difícil acompanhar seus namoros. Depois de mim veio o Kenneth, e agora o David. Por que trocou o Kenneth pelo David?

JANET - Obviamente ele é mais simpático.

BRANDON - E certamente mais rico.

JANET - Isso foi baixo, até mesmo para você.

Voltam a outra sala.

JANET - Há quantos anos eu disse: "Faz cócegas?" Não me diga.

KENNETH - Soube que Rupert virá.

BRANDON - Foi convidado. Nunca se sabe.

KENNETH - Espero que venha. Como está ele?

JANET - Quem é ele?

KENNETH - Rupert Cadell. Foi nosso diretor no colégio.

JANET - Diretor desses três anjos.

BRANDON - Quatro. Tentou ensinar o David também.

KENNETH - O Rupert agora é editor, não é?

JANET - De sucesso? Talvez me dê emprego.

BRANDON - O Rupert só publica aquilo de que gosta, geralmente filosofia.

JANET - Letra pequena, muitas palavras, poucas vendas.

BRANDON - O Rupert é extremamente radical. Sabia que seleciona os livros baseado na idéia de que as pessoas podem pensar, além de ler? É interessante, gosto dele.

KENNETH - Sempre gostou. As discussões que costumavam ter na escola. Brandon ficava por horas aos pés do mestre.

Brandon aos pés de alguém??? Quem é este Rupert?!

KENNETH - Ele contava as coisas mais esquisitas, não é?

JANET - Que tipo de coisas?

BRANDON - Acho que o Kenneth quer dizer... a impaciência de Rupert com convenções sociais. Por exemplo, acha que assassinato é crime para a maioria, mas um privilégio de poucos.

A campainha toca. Wilson surge, apressada. Brandon abre a porta.

BRANDON - Tudo bem, eu atendo. (abre-a) Sr. Kentley, que bom que veio.

Sra. Kentley e Sra. Atwater entram.

KENTLEY - A Sra. Kentley não está bem. Trouxe minha irmã, a Sra. Atwater. Ficará conosco.

BRANDON - Será um prazer.

Wilson pega os chapéus e sai de cena.

ATWATER - O prazer é meu, meu rapaz. Estou em Nova York há duas semanas. Alice tem estado doente o tempo todo e Henry fica catalogando sua biblioteca.

KENTLEY - Às vezes leio um de meus livros.

ATWATER - Estou de visita, Henry. É minha segunda festa. Acho que é justo.

Wilson volta.

WILSON - Dê-me suas coisas.

ATWATER - (Entrega-lhe o casaco.) Obrigada.

WILSON - Sinto muito sobre a Sra. Kentley.

ATWATER - É só um resfriado.

WILSON - Nessa época pode ser perigoso. Espero que esteja de cama com muito suco de frutas.

ATWATER - Está. Obrigada.

Os dois homens tentam conversar, mas elas falam mais alto.

WILSON - Isso resolve o problema.

ATWATER - Resfriado perigoso no calor? Não entendo isso.

WILSON - Dois anos atrás peguei um. Fiquei de cama por três semanas.

BRANDON (afastando Wilson) - Com licença... Por aqui, Sra. Atwater.

Deixam Wilson falando sozinha e vão todos para a outra sala.

ATWATER - David!

BRANDON - Enganou-se. Esse é Kenneth Lawrence.

ATWATER - Sinto muito.

BRANDON - Tudo bem. Muita gente confunde o Kenneth com o David, mesmo quem não tem miopia.

Close nas mãos de Philip, que se cortou com uma taça.

KENTLEY - Não temos muita chance de observar a semelhança. Não andou estudando?

KENNETH - Estou tentando.

KENTLEY - Querida, a semelhança é apenas física.

BRANDON - Acho que conhecem a Srta. Walker.

ATWATER - Janet, querida. Terminei seu horóscopo antes de vir.

JANET - Conte.

ATWATER - As estrelas são generosas. Indicam casamento em breve, com um jovem louro alto, com um pai muito gentil.

KENTLEY - Eu disse isso a semana passada.

ATWATER - Sim, mas as estrelas confirmam.

JANET - Que maravilha.

BRANDON - Sra. Atwater, quero lhe apresentar o Sr. Philip Morgan.

PHILIP - Como vai?

ATWATER - Machucou sua mão?

PHILIP - Não é nada, foi só um corte.

BRANDON - O que houve?

PHILIP - Nada. O copo estava trincado e quebrou-se. Aceita um champanha?

ATWATER - Adoraria. Papai tomava uma taça todas as manhãs às 11h, mas Henry não gosta.

Philip e Atwater saem de cena.

BRANDON - Sr. Kentley, aceita uma taça?

KENTLEY - Prefiro um pouco de uísque com bastante água. O David está aqui?

Brandon vira-se para servi-lo.

BRANDON - Pensei que viria com vocês.

KENTLEY - Ele ligou-me avisando que nos encontraria aqui.

Brandon sai de cena. Ambos sentam-se.

JANET - De onde ele ligou?

KENTLEY - Nossa empregada que atendeu. Estava no clube estudando para os exames de tênis.

JANET - O David não precisa estudar, ele é muito inteligente.

KENTLEY - O David está indo muito bem.

JANET - Obrigada. Como está a Sra. Kentley?

KENTLEY - Como sempre. Agora está resfriada. Espero que o David chegue logo. Ela quer que ele ligue.

JANET - O David é o único filho.

KENTLEY - Meu também, mas permitirei que ele cresça.

JANET - Ligarei para ela avisando que ele se atrasou.

KENTLEY - Não se preocupe.

JANET - O David pode ter parado para vê-la.

Brandon volta com um copo e entrega-o a Kentley.

JANET - Posso usar o telefone?

BRANDON - Claro. Está no quarto.

JANET - Que aconchegante.

BRANDON - Pronta para outra?

JANET - Em breve.

Janet bebe e entrega seu copo vazio a Brandon, que vai em direção ao baú, perto de onde está Kenneth.

JANET - Agora estou. Obrigada.

KENTLEY - Que jovem charmoso. O David devia ser mais amigo dele.

JANET - Vou telefonar.

Janet sai de cena.

BRANDON - Kenneth, tem muito ar no seu copo.

KENNETH - Está bem, obrigado.

BRANDON - Leva isto para a Janet?

KENNETH - Claro. Por quê?

BRANDON - Nenhum motivo em particular. É dela. Achei que gostaria de levar para ela. Está no quarto, telefonando.

KENNETH - Quer que o David entre de supetão.

BRANDON - Seria um choque tremendo.

Kenneth sai de cena, levando os copos.

PHILIP - 14 de julho. Pode prever meu futuro?

ATWATER - Sou astróloga amadora.

PHILIP - Com certeza é muito boa.

ATWATER - Quer saber se sua apresentação será um sucesso?

PHILIP - Quero sim.

ATWATER - Vejamos. Nasceu em 14 de julho. É câncer, o caranguejo. É da lua. É influenciado pela lua. Posso ver suas mãos? Sabe a hora do seu nascimento?

Olha as mãos dele.

PHILIP - Não.

ATWATER - Bons dedos, fortes. Artísticos.

PHILIP - E a apresentação?

ATWATER - Estas mãos lhe trarão grande fama.

KENTLEY - Considero-me um homem de muita sorte. Estou a postos para a abertura.

PHILIP - De quê?

KENTLEY - De sua coleção, por assim dizer.

PHILIP - Sim, claro.

Kenneth e Janet voltam.

ATWATER - Vai tocar. Que ótimo.

JANET - Sua esposa mandou um abraço.

KENTLEY - O David não estava lá?

BRANDON - Estará aqui num minuto.

Plano geral. Philip começa a tocar o piano. Rupert entra.

RUPERT - Seu toque melhorou, Philip.

BRANDON - Rupert, pensei que não viesse.

RUPERT - Mas me conhece.

BRANDON - Sra. Atwater, lhe apresento o Sr. Rupert Cadell.

ATWATER - (sorrindo) Encantada.

BRANDON - O Sr. Kentley.

Cumprimentam-se.

RUPERT - Como vai?

KENTLEY - Rupert Cadell, diretor de Somerville?

RUPERT - Costumava ser.

KENTLEY - Deve ter ensinado meu filho, David.

RUPERT - É um elogio. Como vai?

KENTLEY - Olá, amigo.

RUPERT - Sra. Walker.

JANET - Como sabe?

RUPERT - Brandon falou de você.

JANET - O que disse foi justo?

BRANDON - Você merece justiça.

RUPERT - Kenneth Lawrence, você cresceu! Ora, as aulas acabaram, pode dizer.

KENNETH - Não mudou nada. Prazer em vê-lo novamente.

RUPERT - (bravo) Por quê? (rindo) Não ligue, prazer em vê-lo novamente. (Vendo a taça de Kenneth) Isso parece ser champanha do bom. (olha para a garrafa) E é. Bom champanha. Qual é a ocasião?

BRANDON - Disse-lhe ao telefone. Começou sendo uma festa para o Sr. Kentley, para que pudesse ver as primeiras edições. O Philip e eu vamos para o interior.

Brandon serve uma taça a Rupert.

RUPERT - Também me contou isso.

BRANDON - Contei?

RUPERT - Sim.

BRANDON - Pensei em fazer uma festa de despedida para o Philip.

RUPERT - Portanto champanha. Entendo.

BRANDON - É verdade.

RUPERT - Sempre gagueja quando fica entusiasmado.

BRANDON - Fico sempre entusiasmado quando dou uma festa.

RUPERT - É mesmo?

Wilson entra, com uma bandeja.

WILSON - Sr. Cadell?

RUPERT - Sra. Wilson. O que temos aqui?

WILSON - Tenho aquele patê especial de que gosta.

RUPERT - Não gosto mais. Estou brincando.

WILSON - Você é terrível.

RUPERT - Obrigado.

WILSON - Comece a cortar. Trarei o resto em breve. Ah, Sr. Brandon, o encontrei.

BRANDON - Não faço a mínima idéia do que perdeu.

RUPERT - A maravilhosa Sra. Wilson. Talvez me case com ela.

Janet aproxima-se.

JANET - Parece uma delícia. Espero que David chegue logo.

RUPERT - Onde está o David?

JANET - Não faço a mínima idéia. Está tão atrasado que o Sr. Kentley está perturbado.

RUPERT - E você?

JANET - Eu? Estou com fome. (servindo-se)

RUPERT - Brandon, o que é isto?

BRANDON - Um cassone, da Itália.

RUPERT - Por que a comida está sobre ele?

BRANDON - Transformei a sala de jantar em biblioteca.

RUPERT - Sabia que encontraria outro uso para o baú. As estórias que ele contava sempre tinham um baú. "The Mistletoe Bough" foi sempre seu conto favorito.

JANET - Sobre o que era?

Kentley aproxima-se. Rupert acende um cigarro.

KENTLEY - Não me lembro do começo. Era sobre uma bela jovem. Ela era noiva. No dia do seu casamento escondeu-se num baú.

BRANDON - Isso mesmo.

KENTLEY - Infelizmente, a trava era de mola. Encontraram-na 50 anos depois.

JANET - Não brincarei assim.

BRANDON - Sirvam-se, por favor.

ATWATER - Falando de esqueletos, viram aquela coisa nova no Strand?

JANET - Sim, adorei.

ATWATER - Gostou? Ótimo. Não gostei da nova moça, deve ser de Escorpião.

JANET - Também não gostei dela, mas suas roupas eram fabulosas.

ATWATER - Simplesmente divinas.

JANET - Esplêndidas.

RUPERT - Preciso ver.

JANET - Claro, o homem de meus sonhos é James Mason.

RUPERT - Ele é bom?

JANET - Absolutamente fantástico.

ATWATER - Um sinistro atraente. É de Touro, muito obstinado.

RUPERT - É mesmo?

ATWATER - Mas tenho algo a confessar. Gosto do Mason tanto quanto do Errol Flynn.

JANET - Eu prefiro o Cary Grant.

ATWATER - Eu também. De Capricórnio. É divino! É um pedaço.

JANET - Verdade.

ATWATER - Foi incrível naquele filme novo com a Bergman. Como se chama? "O-não-sei-quê-do-não-sei-quê". Não, esse é o outro. Este é só "Não-sei-quê". Era como, sabe...

RUPERT - Tenho na ponta da língua.

JANET - Eu também. Era algo simples. Adorei. E a Bergman...

ATWATER - É do tipo Virgem, como todos estes... você sabe.

RUPERT - Fui ao cinema uma vez. Vi Mary Pickford.

ATWATER - Ela me encantou. Não gostou dela? O tipo Virgem, como todas as outras.

JANET - Em que a viu?

RUPERT - Não me lembro bem. Era "Não sei quê do não sei quê". Ou era apenas "Não sei quê? Ou algo bem parecido.

JANET - Acredito que nunca tenha ido.

Wilson aproxima-se.

WILSON - Se fosse você, moderava no patê. Calorias.

BRANDON - Não seja grosseira. Poderia ajudar a Sra. Atwater, Philip?

PHILIP - Com prazer. Sente-se, eu levo para a senhora.

ATWATER - Muito obrigada.

Atwater senta-se.